segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Estudo da Unicamp pode ajudar a diminuir injeções diárias de insulina

Pesquisa mostra que a citocina pode proteger as células secretoras de insulina contra a morte por pelo menos um período de 30 dias

Pesquisa feita com animais na Unicamp indica que a citocina anti-inflamatória - extenso grupo de moléculas envolvidas na comunicação entre as células durante a resposta imune - pode garantir um efeito protetor prolongado, defendendo as células secretoras de insulina por até 30 dias após o início do tratamento, abrindo novas possibilidades de terapia contra o diabetes. O estudo sugere a diminuição da necessidade de injeções diárias, o que pode melhorar a qualidade de vida.


O estudo mostrou que a citocina anti-inflamatória Ciliary Neurotrophic Factor (CNTF) foi capaz de evitar a morte de células produtoras de insulina (beta pancreáticas). " Assim, como uma das causas do diabetes é a morte dessas células produtoras de insulina, o CNTF pode ser um novo aliado na luta contra esse mal" , diz o pesquisador Gustavo Jorge dos Santos. Dados do International Diabetes Federation (IDF) mostram que, no ano de 2010, mais de sete milhões de brasileiros foram afetados pela patologia e, segundo projeções da Organização Mundial da Saúde (OMS), esse número deve dobrar até 2030.

O pesquisador investigou se esse efeito protetor do CNTF agia contra a morte causada pela droga aloxana ou pela citocina inflamatória interleucina-1-beta (IL1-beta) em células produtoras de insulina de camundongos (MIN6) e se o efeito do CNTF dependia da regulação da via da proteína AMPK (proteína quinase ativada por AMP), que atua como um ' sensor energético' celular. A investigação começou em 2009 partindo de dois princípios: já se sabia que o CNTF protegia as ilhotas pancreáticas e que a AMPK participava do processo de morte celular. Assim sendo, o biólogo Gustavo Jorge ficou intrigado se esse efeito protetor do CNTF dependia da inibição da AMPK e se ela era importante no processo de morte de célula produtora de insulina e, talvez, no desenvolvimento do Diabetes mellitus.

Método

Os testes foram feitos em camundongos com três dias de vida e com células em cultura que secretavam a insulina (MIN6). Para a realização dos experimentos e para responder à pergunta inicial, quatro grupos foram formados: os que receberam somente CNTF, somente aloxana, e CNTF mais aloxana, além do grupo-controle, que não recebeu nenhum dos dois.

Observou-se que as células que recebiam CNTF junto com aloxana (substância diabetogênica) morriam menos que as que recebiam somente esta droga, mostrando que o CNTF protegia as células, conta Gustavo Jorge. Além do mais, quando tais células não expressavam a proteína AMPK, o CNTF já não conseguia mais protegê-las, mostrando que seu efeito protetor dependia da inibição dessa proteína.

O autor do trabalho afirma que os mesmos dados verificados nas células tratadas com aloxana foram observados em células MIN6 tratadas com IL1-beta, ou seja, o CNTF foi capaz de proteger a morte de célula produtora de insulina tanto frente a uma indução por aloxana quanto por IL1-beta. Ele salienta ainda que " nos dois modelos de morte de célula a AMPK foi necessária para o efeito protetor do CNTF" .
Já se sabia que o CNTF melhorava o quadro de diabetes de pacientes, por aumentar os efeitos da insulina no organismo (sensibilidade periférica) e reduzir a obesidade. No entanto, ainda não havia sido notada a capacidade do CNTF em aprimorar a capacidade secretora de insulina do organismo, por manter vivas mais células-beta. Gustavo Jorge comenta que " os efeitos do CNTF nos tecidos periféricos (muscular, adiposo) e no Sistema Nervoso Central (SNC) já eram conhecidos; faltava saber como o CNTF agia na proteção das células produtoras de insulina" .

O coorientador da dissertação salienta que o trabalho provou que a ativação da AMPK por aloxana e por IL1-beta é, pelo menos em parte, responsável pela morte de células-beta provocada por essas drogas. Trata-se de um fato novo, já que a ativação dessa proteína tem sido hoje proposta, aliás, como uma panaceia para a cura de várias doenças, inclusive do diabetes. Hoje em dia muitas pesquisas tentam promover a produção de medicamentos para ativar a AMPK no organismo. Neste trabalho, os pesquisadores advertem que essa premissa deve ser vista com cautela, pois, " apesar de melhorar o efeito da insulina, a ativação da AMPK iria matar as próprias células que produzem a insulina".

Conforme comenta Luiz Rezende, a axoquina - um análogo ao CNTF - foi empregada nos primeiros testes clínicos do diabetes, mas, à época, o que estava sendo avaliado era o seu efeito antiobesidade. A preocupação então se dirigiu mais para averiguar se, com ele, perdia-se peso, massa adiposa, do que propriamente com os efeitos sobre o diabetes, fato que passou a ser investigado somente mais tarde.
Indagado sobre a expectativa de cura do diabetes, Gustavo Jorge esclarece que essa hipótese ainda está descartada no momento, " porém, se o paciente se submeter ao tratamento adequado" , diz, " ele poderá viver bem" . Esse tratamento inclui essencialmente controle da ingestão de alimentos (qualidade e quantidade), aplicação correta de insulina, realização de atividade física regular e acompanhamento médico-nutricional.

Hormônio regula concentração de glicose

Como o CNTF e a AMPK desempenham funções importantes nas células beta-pancreáticas, ambos poderão ser alvos terapêuticos para o tratamento do diabetes. Contudo, a interação entre esses dois fatores em células secretoras de insulina permanecia desconhecida, interação esta que foi elucidada pelos pesquisadores neste trabalho.

A insulina é um hormônio hipoglicemiante produzido pelas células-beta das ilhotas de Langherans, localizadas no pâncreas. Sua principal função é regular as concentrações de glicose no plasma. Ela proporciona a captação de glicose na quase totalidade dos tecidos do corpo (exceto cerebral, eritrócitos e células renais). Normalmente, a insulina é liberada em situações de altos índices de glicose plasmática, como por exemplo após as refeições. Ela atua reabastecendo as reservas de glicogênio nos músculos e no fígado, e incentivando o seu armazenamento no tecido adiposo. De certa forma esse hormônio prepara o organismo para uma fase de jejum.

A pesquisa faz parte de um estudo de mestrado desenvolvido no Instituto de Biologia (IB) pelo pesquisador Gustavo Jorge dos Santos orientada pelo professor Antonio Carlos Boschero e coorientada pelo professor Luiz Fernando de Rezende, que integra a linha de pesquisa de Pâncreas Endócrino.

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